Lendas do folclore baiano
Conta a lenda de um escravo chamado Inácio, que tinha como proprietário um poderoso fazendeiro da região de Lençois na Bahia, nos tempo do Império antes da promulgação da Lei Áurea. A sinhazinha filha do fazendeiro e o escravo se apaixonaram e tiveram um romance às escondidas por um certo tempo, até que alguém desconfiou e descobriu tudo, fazendo chegar aos ouvidos do pai da sinhazinha toda história. O grande fazendeiro enfurecido com o fato, ordenou ao capataz que tirasse a limpo aquele absurdo e caso fosse confirmado era para torturar e depois dar cabo da vida do maldito escravo que estava abusando de sua filha.
Esta ao saber do decisão do pai de punir o seu amado, correu ao seu escravo para contá-lo e impedir que lhe fosse feito algum mal, pois ela o amava. Inácio no início resistiu, pois queria enfrentar a situação. Mas por insistência da sinhazinha aceitou fugir com a promessa de que iriam se encontrar e ficar juntos para sempre. Esta lhe fez tal promessa de amor eterno se jogando aos seus braços com lágrimas nos olhos e pedindo desesperadamente que tomasse todo cuidado. Que fugisse por algum tempo até as coisas esfriarem. Depois dariam algum jeito de se ver. Como prova de seu amor deixou com Inácio, sua linda e querida sombrinha comprada na Europa, para que ele sempre recordasse dela. Se despediram rapidamente antes que o capataz pudesse surpreendê-los. O escravo Inácio deu início a sua fuga o mais rápido possível.
Quando o capataz chegou à senzala com uma tropa de capangas fazendo o maior alvoroço na busca do maldito escravo, indagou a todos que não souberam informar o paradeiro de Inácio, torturou alguns mais chegados e não conseguiu nada. Voltou para a casa grande e informou da fuga ao fazendeiro, que ficou muito bravo. Este interrogou a filha, que sob pressão, confirmou a fuga do amante. O pai enfurecido, determinou ao capataz e aos capangas pistoleiros que capturassem o fugitivo o mais depressa possível, estes deveriam trazê-lo até a fazenda para ser torturado e morto na frente de todos para servir de exemplo. Os capangas sob o comando do capataz da fazenda um sujeito muito cruel e enciumado de Inácio por ter um caso com a filha do fazendeiro, saiu em disparada em busca do fugitivo. Inácio que era muito esperto e conhecia bem a região ficou muito tempo escondido nas matas fechadas da Chapada Diamantina, comia frutas, leguminosas, raízes, pequenos animais, aves e peixes que conseguia capturar.
Passaram-se meses de um lugar para o outro em grutas, cavernas, acampado na mata, sempre próximo de rios e cachoeiras onde se banhava e se alimentava com facilidade. Mas sempre atento para não ser capturado pois seria o seu fim. Pensava muito em sua amada sinhazinha e isso era o que dava forças para continuar fugindo e se escondendo na esperança de um dia viver em paz com sua amante querida. Ao mesmo tempo a caçada ao fugitivo aumentava a cada dia, pois o fazendeiro passou a nutrir um ódio cada vez maior pelo escravo, por que passou a ser motivo de escárnio entre os fazendeiros locais e populares.
Então chegou ao capataz uma notícia segura do paradeiro do escravo, que ele havia sido visto num riacho próximo e abaixo de um morro. E lá foi visto com uma senhorinha branca a passear. O capataz raivoso viajou com sua tropa de pistoleiros seguindo a pista do escravo, que se encontrava descansando numa pequena gruta perto de uma bica que leva o seu nome hoje, pensava até que já tinham se esquecido dele quando de repente, ouviu barulho de cavalos e gritos se aproximando pelo mato.
Correu em disparada só pegou a sombrinha da sua amada e começou uma fuga louca pelo mato fechado sentindo os inimigos em seu encalço, determinados a captura-lo de qualquer jeito. Quando teve a ideia de se esconder no topo do morro a sua frente. Como era uma tarde chuvosa e escurecida, ele conseguiu se distanciar e escapou, logo ao anoitecer começou a subir morro acima.
Os capangas não conseguiram nada e retornaram para a grande fazenda de mãos vazias. O fazendeiro ficou irado e ofereceu até recompensa pela captura do escravo fugitivo vivo ou morto. Dias depois retornaram ao local com a notícia que o escravo estava escondido no alto do grande morro. Todos estavam muito bem armados e determinados a receber uma gorda recompensa. Enquanto isso a pobre sinhazinha tinha sido confinada em casa, no quarto e proibida de sair.
Os pistoleiros então seguiram morro acima para dar um fim aquela história de uma vez por todas. Mas o escravo Inácio que era muito esperto e conhecia aquele morro como a palma da sua mão, planejou uma fuga muito mais espetacular e definitiva, caso fosse surpreendido pelos capangas do coronel. Conhecia aquelas pedras e grutas escavadas nas rochas como ninguém e poderia engana-los facilmente e foi o que fez. Pensou em se apresentar ao capataz e aos capangas para que estes tentassem alveja-lo e simularia uma queda do morro para que pensassem que ele teria morrido e assim o deixariam viver em paz. E tudo ocorreu como havia pensado. Quando ele percebeu a chegada da tropa de capangas fingiu que estava assustado e correu sobre as pedras saltando de um lado para o outro, os facínoras começaram a disparar suas armas tentando atingi-lo, mas o escravo era um negro rápido, ágil e destemido.
Os capangas sob ordem do capataz se espalharam pelo morro, eram mais de vinte pistoleiros armados, contra apenas um homem desarmado, mas com um sonho inabalável de viver um grande amor com a sua sinhazinha. Grudado em sua sombrinha, o negro Inácio correu para a beira do morro que ficava a uns trezentos metros de altura. E ao sentir que os capangas se aproximavam atirando cada vez mais, deu um salto fantástico para o precipício e a sombrinha se abriu em sua mão sumindo de vista dos capangas que o perseguiam.
Estes ficaram atordoados, pois nem sinal do escravo, ele simplesmente tinha sumido no ar. Nenhum tinha a coragem de ficar tão próximo a borda da pedra do morro para verificar a queda e o paradeiro do corpo do escravo, nem mesmo o capataz conseguiu pois ventava muito e uma queda seria fatal.
Como não encontraram o corpo, decidiram voltar ao coronel e dizer que o escravo havia se jogado morro abaixo e que ao bater nas pedras haveria morrido e o corpo ficara em pedaços espalhados morro abaixo. Como foi dado como morto o escravo parou de ser perseguido pelo fazendeiro. Porém, o negro Inácio, nosso herói, continuou vivinho como havia planejado. No local onde ele fez o pulo daquela borda saliente da pedra, há alguns poucos metros abaixo, havia uma outra borda de pedra onde ele amorteceu o salto e se encolheu encostado em um vão junto a parede do pedra do morro, para evitar que fosse localizado pelos inimigos dando a eles a impressão que teria se precipitado morro abaixo. O fazendeiro de início não acreditou muito não e foi até lá no morro para verificar, mas quando viu o local onde o escravo que havia pulado se convenceu da morte do infeliz.
Algum tempo depois a sinhazinha voltou a sair de casa e a encontrar com seu amante numa grutinha junto ao morro. Tomava muito mais cuidado para não serem descobertos. Só que a sinhazinha havia engravidado do escravo seu amante. O pai da moça que já estava doente de tanta raiva que passou, piorou muito mais a sua saúde, que já era debilitada pela idade.E em pouco tempo veio a morrer. Foi então que os sonhos do escravo Inácio e sua sinhazinha se realizaram, pois assumiram o relacionamento amoroso, tiveram um lindo filho e viveram felizes pelo resto de suas vidas. Daí surgiu o nome para aquele lindo morro, em homenagem ao escravo Inácio que se tornou pai do filho de sua sinhazinha. Por isso Morro do Pai Inácio, um dos cartões postais mais lindos da Chapada Diamantina.
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